Wednesday, May 24, 2006

Caso 24

Marta estava a oferecer ao seu delicioso corpo uns dias de descanso, beneficiando dos prazeres do sol, presenteados por uma praia deserta; por isso, aproveitando o feriado, pegou no seu carro e rumou para uma paradisíaca praia algarvia. Como tinha um caso prático para resolver, levou consigo o seu portátil, navegando na net, enquanto outros ao longe surfavam na praia. Apesar da ansiedade de deixar envolver pelas quentes águas, decidiu aproveitar o aprazimento de uma viagem calma.
A sua música predilecta, cantada por Paulo Gonzo, entoava em alto volume no seu carro, foi interrompida por uma triste noticia que chocava a nação; na rádio desfilavam vozes que normalmente gritavam nos telejornais, que em tom compadecido, sussurravam expressões como "profundamente chocado", "abalado e triste", "uma enorme perda para o país".
Decidida a não se deixar entristecer, apressou-se a desligar o rádio e a fazer uma pausa para café, numa esplanada na deslumbrante Mértola. Regressada ao volante, decidiu prolongar a sua viagem junto ao rio e conhecer Alcoutim e as margens do Guadiana.
Foi já nesta estrada que sucederam os factos que aqui se relatam. Marta circulava em velocidade moderada quando, um táxi, conduzido em excesso de velocidade por Bernardo, empregado da empresa de Táxis “Vai comigo, não vás com ele”, que ao mesmo tempo que conduzia enviava sms de carácter impróprio à namorado do vizinho, embateu com violência no carro de Marta.
A tragédia de Marta ampliou-se quando ao sair do carro, ilesa; a sua saia ficou presa na porta, tendo-se rasgado. Assim, ficou apenas com o seu biquini pequenino às bolinhas amarelas que tinha comprado numa loja ao pé do liceu; curiosamente, os condutores, em catadupa, começaram a parar, solícitos para auxiliar a jovem desprotegida.
Um desses condutores, Carlos, hipnotizado pela beleza de Marta, perdeu o controlo do veículo tendo embatido na jovem, que estava no meio da estrada a conversas distraidamente com Fernando que morreu instantaneamente.
Os pais da jovem, inconformados, pretendem responsabilizar Carlos, Bernardo e a Empresa de táxis por todos os prejuízos, inclusive a morte da filha.
QVID IVRIS

Monday, May 22, 2006

Caso 23

Numa esplêndida noite de sábado, Susana foi andar de bicicleta no parque da cidade, de forma a preparar-se para encarar de ego elevado as férias de verão e, simultaneamente desfrutar da lua que magnânima iluminava a noite; o seu ex-namorado, que desde que foi trocado pelo simpático Jorge, desenvolveu uma fixação por ela, seguiu-a. A dado momento o seu cão – um perigoso pastor alemão – perseguiu a bicicleta, tendo derrubado e mordido furiosamente a amorosa Susana, nas pernas e braços, que, tolhida de medo, foi incapaz de esboçar uma reacção.O pânico de Susana apenas terminou quando apareceu Manuel: percebendo a gravidade da situação e temendo pelas consequências, retirou do carro a sua caçadeira e abateu o cão. Depois, ao constatar que o ex-namorado de Susana fugia do local, correu na sua direcção e amarrou-o a uma árvore, enquanto esperava pelos agentes da PSP e pelo INEM.O sofrimento de Susana agudizou-se porque o INEM demorou duas horas a chegar: ao chegar ao Hospital, já nada havia a fazer. A autópsia foi conclusiva: a morte teve como causa a perda de sangue derivada de Susana ter estado horas sem ser atendida.

Caso 22

Filipa é uma menina de cinco anos, com uns divinos caracóis loiros que lhe cobrem o rosto. Adora a praia. O seu dia predilecto na escola é o dia de ir à praia.
Naquela manha tudo começou como é normal; saíram no autocarro da escola às 9h15 e rumaram para a praia, onde chegaram pouca antes da 10h. Depois das brincadeiras na areia, chegou o esperado momento de ir para o banho.
Filipa agarrou a mão de Susana (a educadora) e foi para a água, tendo o cuidado de levar as suas braçadeiras.
Tudo aconteceu muito rapidamente: Susana foi fumar um cigarro com um amigo que há anos ela amava em silêncio; bastaram dois minutos para a pequena Filipa se deixar enrolar nas ondas; Ernesto, o nadador salvador, correu para o mar logo que foi avisado e tentou tudo para salvar a pequena, tendo mesmo colocado a sua vida em risco. Não obstante a sua diligência, não conseguiu os seus intentos.

Caso 21

Patrícia deu entrada no Hospital após um acidente de mota, resultante do embate com Paulo que conduzia em excesso de velocidade e com uma TAS de 1,85 gr, para ser operada de urgência a uma perna.A operação só veio a acontecer cerca de duas horas depois, uma vez que o único médico de serviço habilitado a realizar a operação se encontrava num encontro íntimo com uma das enfermeiras.
Pelo facto de operação só ter ocorrido duas horas depois, Patrícia faleceu, uma vez que perdeu demasiado sangue; a autópsia foi conclusiva: se Patrícia tivesse sido operada mais cedo, não teria falecido.

Caso 20

Marisa estava simultaneamente nervosa e excitada: pela primeira vez na sua vida ia presenciar um jogo de futebol. E não era um qualquer e banal jogo: era um jogo do Euro, em que Portugal defrontava a equipa da Rússia. O bilhete tinha sido adquirido meses antes, pelo valor singelo de 100 Euros, mais portes de envio e destinava-se à bancada central.
Impregnada pelo fervor nacionalista, tinha preparado com esmero a indumentária a utilizar: tinha decidido levar uns sapatos e meias verdes, uma curta e bela mini-saia amarela e um top vermelho. Três dias antes, na companhia da sua mais intima amiga, dirigiu-se a uma paragem de táxis e acordou com o taxista todos os pormenores da viagem, nomeadamente decidido que partiriam da sua aldeia às 14h00 (não o quis afirmar, mas há muito decidira que antes da Catedral do Futebol (o estádio da Luz, obviamente) iria percorrer a Catedral do Consumo (o centro comercial frente ao estádio). Por estes e outros secretos motivos, Marisa não conseguiu dormir na véspera do jogo.
A manhã que despertou magnifica não augurava o que iria suceder: o dia de ilusão depressa se transformou numa completa desilusão; o taxista (conhecido na aldeia pela sua dependência alcoólica) havia passado toda a noite no aniversário do seu irmão, esquecendo-se, por completo, do contrato realizado com Marisa. Esta, ao tomar conhecimento do sucedido, e não obstante ter tentado por todos os meios um meio de transporte alternativo, foi coagida a ver o jogo pela televisão, sentada, de olhos vermelhos, com a roupa cuidadosamente preparada, no umbral decrépito da sua janela.
Ao seu lado, Mariana, que também passara a tarde em choro compulsivo, ainda que por diversas motivações: não tinha onde morar. A sua casa tinha sido vendida a Fernando, três meses antes, – apesar de ter sido acordado que só ontem seria entregue a este – uma vez que hoje era a data acordada para a nova casa estar concluída.

Caso 19

Joana foi tomar um banho nocturno com o seu namorado Pedro, numa barragem perdida no Alentejo. Durante a viagem, enquanto o casal trocava carícias, Pedro descontrolou-se e embateu com violência numa árvore.
Em consequência do grave acidente, ficou internada durante meses num Hospital. Uma noite, João, enfermeiro, alcoolizado, violou-a. Três dias depois João repetiu o acto, nas mesmas circunstâncias. Quem pode ser responsabilizado pela violação?

Caso 18

Madalena e Cristina não esmoreceram por o contrato celebrado com António não se ter concretizado. Desejando cumprir o seu sonho de viverem em conjunto; para tanto celebraram com João um acordo pelo qual, mediante o pagamento de 200,00 Euros, usufruíam livremente da casa de João. Como João não confiava nas amigas, exigiu que estas assinassem um documento em que, no caso de não pagamento, João tinha uma garantia de pagamento sobre o carro.
Porque a casa não correspondia ao que sonharam, as amigas adquiriram um terreno e contrataram com Pedro a construção de uma casa; a obra estava a cumprir os prazos acordados, pelo que Madalena e Cristina viviam a concretização de um sonho: os rostos das amigas espelhavam uma felicidade que era a inveja de todos aqueles que com elas se cruzavam.
E assim foi… até que o sonho virou pesadelo. Foi um domingo, um domingo de Julho, no final de uma tarde de calor, em que os corpos gritavam por descanso. Indignadas por manifestações xenófobas, as amigas foram participar num desfile contra a homofobia. Os acontecimentos precipitaram-se quando militantes extremistas, invadiram a manifestação e agrediram todos os que participavam pacificamente na marcha; um dos extremistas – Paulo, de seu nome – com uma faca, atacou Cristina, desfigurando-a na face; Cristina, ainda conseguiu evitar que os ferimentos fossem maiores, agredindo Paulo com um taco de basebol.
Madalena surgiu e ao ver o rosto de Cristina chorou compulsivamente; olhar para aquele rosto lindo e angelical, agora marcado por toda a vida, enchia-a da mais marcada tristeza: num único segundo, tirou a pistola a um polícia que acabara de chegar ao local e deu três tiros a Paulo.

Caso 17

Madalena conheceu Cristina no primeiro dia de aulas; ambas eram caloiras e estavam a ser vítimas das tristes praxes académicas. Desde o momento em que os seus olhos se cruzaram pela primeira vez nasceu entre ambas uma perfeita empatia e cumplicidade. A amizade entre elas nasceu rapidamente e solidificou-se com o passar dos meses. Tornaram-se inseparáveis: onde uma estava a outra não tardava em aparecer com o seu sorriso, quando uma chorava a outra sofria, se uma estudava a outra também.
Houve um dia – porque nestas coisas há sempre um dia que é a soma de mil pequenas coisas – em que as amigas se olharam de forma diferente, encontrando nos recíprocos olhares uma luz que nunca tinham visto: estavam apaixonadas; contra preconceitos, medos e temores, contra escárnios e zombarias, Madalena e Cristina estavam apaixonadas e dispostas a lutar pelo seu amor.
Munidas da coragem que só o amor consegue dar um ano após o início da sua relação, optaram por casar.
Para viver escolheram um apartamento com uma deslumbrante vista sobre a planície. O apartamento pertencia a António e as amigas celebraram com ele um contrato em que ele se comprometia a vender e elas a comprar o apartamento; este contrato foi celebrado com duas tatuagens que simbolizavam a vontade das partes.
António anos antes tinha celebrado, relativo ao mesmo apartamento, um contrato com Bernardo, em que, caso decidisse vender, dava prevalência a António; porque Bernardo era do Benfica e António era do Porto, decidiu não o informar do contrato que ia celebrar com Madalena e Cristina.
Duas semanas após o contrato celebrado com Madalena e Cristina, António fez um contrato com Duarte, por escritura pública, registo e declaração expressa, em que António se comprometia a vender e Duarte a comprar o mesmo apartamento.
Logo no dia seguinte e ainda tendo por objecto o mesmo apartamento, António vendeu-o a Eduardo, que lhe ofereceu um valor bem superior.

Caso 16

Maria (chamamos-lhe simplesmente Maria para resguardar a sua privacidade) tinha apenas quinze anos. De pobres mas honradas famílias, desde petiz que descobriu a alegria do trabalho, auxiliando a sua mãe nos triviais trabalhos domésticos e na educação dos seus quatro terroristas, como carinhosamente denominava os mais jovens irmãos. A escola, desde o primeiro dia, era o seu maior prazer, o local em que procura consolo e compreensão; aprender a ler, foi o “bilhete” para conhecer o mundo pelas palavras dos seus escritores predilectos. Maria era feia. Mesmo muito feia; daquela feiura que faz realçar o que realmente importa: a sua beleza interior, os seus olhos carinhosos que espalhavam carinho pelos que com ela se cruzavam.
O sorriso permaneceu-lhe na cara até que teve de abandonar a sua pequena aldeia para estudar na cidade. Aqui, o pequeno mundo que conhecia desvaneceu-se: apesar de continuar a ser a mais brilhante das discentes, foi, desde a primeira manhã o alvo preferencial do escárnio das colegas; especialmente três delas – a esbelta Anabela, filha do Presidente da Câmara, a espampanante Vanessa, filha do maior empresário local e a rebelde Elsa, filha da Presidente do Conselho Directivo – que a adoptaram como alvo preferencial de todas as brincadeiras estúpidas e humilhantes.
Dia após dia, mês após mês, ano após ano, não passava uma manhã sem que Maria fosse humilhada pelas colegas: as roupas pobres, o cabelo cuidado em casa, a forma aldeã de falar, o peso, a timidez, os pequenos gestos de carinho para os menos afortunados, eram alvo das mais imbecis e cruéis piadas; quando Maria conseguiu criar uma couraça para as piadas, iniciaram-se as agressões físicas, sendo Maria, por algumas vezes espancada pelas três colegas, facto que era do conhecimento da professora de educação física que, não obstante assistir, nada fez para impedir as agressões. Certo dia, depois de Maria ter feito um golo no jogo de andebol e enquanto tomava um duche, roubaram-lhes as roupas, tendo-a obrigado a percorrer desnudada boa parte da escola, facto do conhecimento da professora de educação física.
As constantes e ininterruptas acções das suas colegas, provocaram profundas alterações em Maria, que perdeu a capacidade de sorrir e sonhar; o que outrora era o seu maior prazer – ir para a escola – era agora o seu maior tormento. Com o passar do tempo, Maria tornou-se uma adolescente triste, complexada, fechada num mundo muito seu incapaz de encontrar o sol da vida. Os pais, que desconheciam os motivos, viam-se impotentes para inverter a tristeza que percorria a filha.
Na semana antes da Páscoa, quando em Informática aprendiam os meandros da Internet, as três colegas fizeram uma montagem de fotografias pornográficas, colocando o rosto de Maria e difundiram um site com as fotos por entre toda a comunidade escolar.
Maria teve conhecimento no intervalo das 10.20; diz quem assistiu que viu cada uma das fotos num impenetrável e inexpressivo silêncio, não esboçando qualquer reacção. Depois saiu da biblioteca; ninguém a viu ultrapassar o portão da escola, ninguém a viu aproximar-se da ponte: sabe-se apenas que se aproximavam as onze horas quando o corpo desamparado embateu no asfalto da estrada, depois de um salto de mais de trinta metros.
Passaram alguns meses; os pais, apoiados pelos vizinhos da aldeia, pretendem processar as três jovens, a professora de educação física e a escola, pelo suicídio de Maria. Podem faze-lo?

Caso 15

Emanuel em toda a sua vida apenas tinha conhecido o lado negro da lua; casado cinco vezes, em todas tinha sido abandonado após traição: suposto pai de três filhos, após testes de paternidade, concluiu-se que eram todos filhos de outros homens. No dia do seu trigésimo quinto aniversário foi despedido, pelo seu pai, e ao chegar em casa encontrou a sua mulher na cama, com uma amiga; por tudo tentou o suicídio, sem sucesso; o dia não acabou sem ser assaltado por um pretenso Coelho da Páscoa, que se aproximou dele, simulando ir auxilia-lo, enquanto ele chorava em cima de uma ponte.
Mas a sua sina mudou: foi o vencedor único de um Jackpot do Euromilhões. A primeira coisa que fez, profundamente embriagado, foi comprar a irmã da ex-mulher (vendida pelo marido que, para conseguir um melhor preço, mentiu sobre as características da esposa). Dois dias depois, adquiriu uma pousada para habitar; porque só viu o imóvel na Internet, não percebeu que as paredes eram verdes, uma cor que Emanuel detesta, pelo que pretende desistir da aquisição.
Nesse mesmo dia, foi jantar com amigos; ao sair do restaurante, foi confrontado por Geraldão (travesti) que munido de uma faca, pretendeu roubar-lhe os sapatos; Emanuel afastou-o com um murro e seguiu o seu caminho e entrou no primeiro bar; a meio da noite, subiu ao balcão e disse que oferecia um milhão de Euros a quem tivesse o maior nariz, embora ninguém ignorasse que era apenas uma brincadeira
.

Caso 14

Florentino Flores cresceu a assistir aos filmes americanos sobre a mafia o que, segundo os psicólogos mais predestinados teve uma crucial influência do seu desenvolvimento psico-social.
As suas brincadeiras de petiz tinham como denominador comum o excessivo recurso a violência gratuita. Ao completar os dezoito anos, deu o grito de Ipiranga, soltou as amarras paternas e deliciou-se de prazeres mundanos. Para conseguir dinheiro não hesitou, logo num primeiro momento, a alienar como autênticos quadros falsificados; se por acaso, um dos adquirentes reconhecia o logro, munido de uma pistola, descarregada, ameaçava-o, conseguindo, com este expediente, os seus intentos.
Certa noite, profusamente embriagado, celebrou um contrato em que vendia o cérebro a um cientista (ainda que com efeitos para depois da morte) como forma de conseguir o dinheiro suficiente para entrar na mais fashion discoteca da Cuba.
De todas as suas múltiplas histórias, a mais hilariante, sucedeu em Marrocos. Entre alguns amigos jocosamente disse a um dos convivas que lhe comprava todos os seus camelos puro-sangue, de modo a dedicar-se à criação do sublime animal nas raias ribatejanas; o árabe, desejoso de alienar os animais, enviou-lhe por barco os animais, não obstante, ter a perfeita consciência que Florentino estava a brincar quando lhe fez a proposta negocial.

Caso 13

Maria fez dezoito anos na noite da passagem de ano; comemorou a entrada na maioridade na praia de Albufeira a assistir ao concerto dos Xutos e Pontapés; para comemorar a dupla efeméride, bebeu muitíssimo mais do que seria desejável e aconselhável. Cerca das quatro da manhã, carenciada de dinheiro para entrar na discoteca mais badalada do Algarve, vendeu um fio de ouro com diamantes de elevadíssimo valor (que tinha sido oferecido por Eduarda, na convicção errónea de que Maria era sua neta) pelo dinheiro de duas entradas na Discoteca e uma garrafa de bacardi.
No primeiro dia do novo ano, foi adquirir um automóvel; o vendedor, aproveitando a manifesta inexperiência de Maria, vendeu-lhe, como se fosse novo, um carro em segunda mão.
Esta não foi a primeira vez que Maria celebrou negócios ruinosos; no ano anterior, adquiriu uma mota de cilindrada inferior à que constava no livrete da mota, facto que o dono da loja onde a mota foi comprada também ignorava. O problema só foi resolvido quando Manuel (seu ex-namorado), munido de uma faca de cozinha, conseguiu convencer Alberto a adquirir a mota. A relação de Maria e Manuel, terminou, no dia em que esta descobriu que ele emprestava dinheiro (proveniente do tráfico de mulheres), a pessoas com necessidades financeiras, cobrando o quíntuplo dos juros normais de mercado.
Escandalizada, Maria terminou o namoro e decidiu abdicar dos homens; nessa mesma semana, decidiu casar com Brunão, homossexual assumido, para que este possa obter o visto de residência em Portugal.

Wednesday, May 17, 2006

Caso 12

João, de cinco anos,
atirou o pau ao gato,
mas o gato não morreu,
D. Xica assustou-se
com o berro que o gato deu
e... morreu.
Quid Juris

Tuesday, May 16, 2006

Caso 11

Deitada nos lençóis velhos e gastos, contemplando um maravilhoso por do sol sobre a baia azul, Maria lia, embevecida, as palavras de Dan Brown: "Nesse tempo não se chamava Silas, embora já não se lembrasse do nome que o pai e a mãe lhe tinham dado. Saíra de casa quando tinha sete anos. O pai alcoólico, um corpulento trabalhador das docas, furioso com a chegada de um filho albino, espancava regularmente a mulher, culpando-a a ela da embaraçadora condição do rapaz. E quando o filho tentava defender a mãe, era igualmente sovado.
Uma noite, houve uma terrível luta, e a mãe não voltou a levantar-se. O rapaz ficou a contemplar o corpo sem vida, sentido uma intolerável vaga de culpa por ter permitido que aquilo acontecesse.
Sou eu o culpado!
Como se uma espécie de demónio lhe controlasse o corpo, foi à cozinha e pegou numa faca grande de talhante. Hipnotizado, dirigiu-se ao quarto onde o pai jazia estendido na cama, mergulhado num estupor alcoólico. Sem dizer uma palavra, o rapaz cravo-lhe a faca nas costas. O pai gritou de dor e tentou voltar-se, mas o filho voltou a esfaqueá-lo, uma e outra vez, até que a casa ficou silenciosa."
Dos olhos castanhos de Maria escorriam gotas salgadas, não causadas pela emoção das linhas, mas pelo reflexo de si mesma, desenhadas nas páginas brancas. Maria é órfã. Os seus pais haviam falecido num acidente de viação, na data do seu primeiro aniversário, por um condutor embriagado.
Por não ter parentes, Maria cresceu e fez-se mulher numa Instituição do Estado.
Apesar de deslumbrantemente bela, os olhos verdes de Maria sempre foram tristes; o seu sorriso tímido e nervoso escondia uma alma triste e sofredora. O seu mais intimo tormento – tornado publico nas angustiantes circunstâncias que vamos relatar em seguida – começara quando a Instituição contratara Ernesto para segurança privado, com a incumbência de cuidar e guardar as internas, impedindo-as de desrespeitar os regulamentos da Instituição.
Rapidamente Maria constatou a fixação patológica de Ernesto, que dos olhares incisivos e indiscretos de volúpia, depressa os tornou em comentários de inconvenientes de gosto duvidoso para começar paulatinamente a tentar alguns contactos físicos.
O epílogo desta triste história ocorreu na noite de Carnaval; contrariamente a todas as suas colegas de quarto, Maria trocou a abominação da noite de Entrudo pelo prazer da leitura; quando as pálpebras já se tinham deixado vencer pelo cansaço, Maria sentiu um vulto a invadir a privacidade da sua cama; em segundos constatou que Ernesto, alcoolizado, segredando-lhe obscenidades, tentava-a violar; ao ver que Maria lhe fugia, invadido por uma raiva canina, não hesitou em agredi-la como uma faca, desfigurando-a de forma irremediável, quer no rosto, quer na alma.

Caso 9

Os aromas da Primavera invadiam o amanhecer; sentado na sua velha cadeira Fernando contemplava o deslumbrante nascer do sol; sob a ampla mesa de madeira podia ver-se pão ainda fumegante, queijo de cabra e ovelha, um presunto do Alentejo, marmelada, doce de morango e um jarro de leite, de verdadeiro leite recém recolhido da vaca Genoveva, que Fernando degustava com prolongado prazer alcançado um autêntico êxtase alimentar.
Detendo-nos nos olhos de Fernando, era impossível ignorar uma lágrima seca de nostalgia: era o seu último amanhecer no velho monte onde nascera, no exacto ano em que Pessoa escreveu que todas as cartas de amor são ridículas pela pena de Álvaro de Campos.
Em silêncio, falava a si próprio, recordando como os fados da vida haviam contribuído para este dia; tudo começara com a sua doença: incapaz de custear as despesas hospitalares, via-se constrangido a celebrar um contrato com Hélder, em que este prometia comprar e Fernando vender o velho monte; no momento da celebração do contrato, através do aperto de mão (entre homens de carácter qualquer outra formalidade é despicienda) Hélder entregara-lhe 25,000 €, a título de sinal.
O negócio definitivo não se realizou de imediato, porquanto, anos antes, Fernando havia celebrado um contrato com Manuel, em que aquele se obrigava para com este a, no caso de decidir alienar o seu monte, conceder-lhe primazia. Apesar de não estar certo dos procedimentos a que estava obrigado, Fernando quis honrar este compromisso.
Uma vez que Fernando precisava de um local para habitar, realizou com António um contrato em que estavam reciprocamente obrigados a comprar e vender um apartamento, pelo valor de 100.000,00 €, sendo, desde logo, entregue a quantia de 20,000,00 €. Para tanto procuraram realizar este contrato cumprido todas as formalidades legais, de molde a obterem a mais ampla protecção legal oferecida por este contrato.
Uns dias antes da data acordada para a celebração do contrato prometido, António recebeu uma proposta de aquisição deste apartamento, pelo valor de 200,000,00 €. Face à proposta, António pretende desvincular-se do acordo com Fernando, mas desconhece as consequências que podem advir do seu acto.
Todo este relato inquietava o nosso protagonista que, naquela manhã primaveril em que se preparava para abandonar o lar onde nascera e se fizera homem, o local em que orgulhosamente vira os seus petizes darem os primeiros passos de uma caminhava que os levou para as grandes cidades, bem longe do carinho paterno, onde netos que mal conhecia, procuravam tornar-se homens numa cidade rodeada de cimento, sem jamais conhecerem o verdadeiro sabor do leite acabado de roubar à vaca Genoveva.

Caso 8

Florentina é a mais rabina das quatro petizes do casal Clementino e Clementina Silva e Silva. Desde a mais tenra idade que demonstrou peculiar inteligência e apetência para fazer tudo aquilo que era suposto não fazer, bem ao contrário dos seus consanguíneos, educados praticantes da mais benemérita e ortodoxa moral cristã.
Por tudo, foi sem surpresa que a presente história foi classificada como verídica e percorre as bocas travessas da pequena aldeia que a viu nascer. Importa contextualizar, informando que Flo (como era conhecida de quem a viu tornar-se uma deslumbrante mulher, de longas pernas, melena morena, olhos pretos penetrantes e sorriso fulminante para os desprotegidos membros do sexo oposto, pelo menos) deixou a aldeia à décima primeira badalada do seu décimo sétimo aniversário. (é irrelevante para o caso, mas sempre se conta que, qual paradoxo, Flo nascera exactamente às 00.00 do dia 25 de Dezembro, pelas mãos de uma parteira pouco sóbria, que trocara a bata branca, pelo fato encarnado do Pai Natal).
Mas regressemos à nossa Flo e deixo-vos aqui a história, tal qual me foi contada por um velho cauteleiro, na esplanada vazia, na praça principal, de uma pequena aldeia do interior alentejano que, por pudor, me abstenho de mencionar. Os relatos (talvez maledicentes) iniciam com o seu casamento com um Conde Austríaco que, de férias em Sintra, trocou as queijadas locais, pelo arroz doce alentejano (como carinhosamente designava a nossa Flo); para alcançar este casamento de princesa, Flo não hesitou em reunir uma interminável colecção de mentiras, predisposta para reunir em si as mais insignes qualidades.
O período de mel do casamento foi inferior a uma semana; aliás, por apego à verdade, podemos mesmo afirmar que na própria noite de núpcias o decrépito (mas sumamente rico) Conde começou a interiorizar o fel do casamento; antes da consumação do matrimónio Flo exigiu que o Conde assinasse um contrato em que se obrigava a pagar determinada importância em troca de relações sexuais.
Logo na primeira semana, Flo exigiu-lhe um carro, topo de gama mas descapotável, em amarelo vivo - porque a discrição não serve para a descrever – ameaçando-o, em caso de recusa, de contactar as revistas de famosos, denegrindo as suas capacidades… matrimoniais. Com receio da sua honra ser atentada, o Conde dirigiu-se nervosamente a um stand situado na Serra da Malveira, com o intuito de adquirir o veiculo exigido pela exigente esposa; por ter dificuldades de expressão em Português, o vendedor vendeu-lhe como novo um carro usado (aproveitando-se dos parcos conhecimentos do Conde que se dirigiu para o sector dos carros usados, o vendedor não o informou deste facto e vendeu-lhe um carro com 1 ano) e uma semana de Time Sharing (o incauto Conde adquiriu este direito ao assinar uma documentação que presumia ser relativa à compra do carro).
Ao regressar a casa com o descapotável amarelo, conduzido pelo seu motorista Barbas, a insaciável Flo agrediu-o fisicamente ao constatar que o carro não era novo.
Dias depois, fingindo lágrimas que não eram suas, Flo pediu ao desconsolado marido Euros 15.000,00 para realizar uma operação plástica, de forma a melhorar o seu aspecto físico; o Conde anuiu e acompanhou-a ao consultório médico sem perceber, em nenhum momento que o dinheiro que pagou seria repartido entre a esposa e o médico, sem realização de qualquer operação.
Por este dinheiro ter desaparecido do património de Flo com a rapidez com que entrou, a nossa heroína exigiu ao Conde mais dinheiro. Perante a recusa, não hesitou em dizer que o ia mandar matar: com o persuasivo argumento o Conde condescendeu em entregar-lhe o numerário.
Encantada com o procedimento, três semanas volvidas, munida de um sabre exigiu que o Conde lhe doasse uma mansão, ao que este anuiu, tolhido pelo pânico.

Caso 10

Esmeralda é a pérola das quatro petizes do casal Cristiano e Cristiana Martins e Martins. Desde a mais tenra idade que demonstrou peculiar inteligência e apetência para auxiliar todos os que a rodeiam, sem menosprezar o sexo, a idade ou a condição, numa incessante luta em benemérito daqueles que necessitavam do seu amparo. Mémé (como era conhecida na sua aldeia) tinha como lema de vida ajudar quem lhe estava próximo, especialmente se desconhecidos; quando procuravam retribuir, dizia sempre: “ajuda alguém que realmente precise! Faz um favor enorme a alguém”. Pensava, desta forma simples e carinhosa, formar uma enorme corrente de solidariedade desinteressada.
Mémé não era bela. Ou, pelo menos, não tinha a anoréctica beleza estereotipada das revistas de adolescentes, sarcasticamente consagrada para generalizar a tristeza. Mémé era, portanto, ligeiramente anafada, mas imensamente feliz.
Mas cingimo-nos à nossa história… Era uma vez uma rechonchuda e pura aldeã, benfeitora nas horas vagas que recebeu um PC portátil como prémio de um concurso de pintura. Aventurou-se nos chats e conheceu um príncipe encantado que prometia vir resgatá-la num lindo cavalo branco, mas, com o correr do tempo se mostrou digno de receber a nomenclatura de um qualquer equídeo de baixa categoria.
Mas regressemos à nossa Méme e deixo-vos aqui a história, tal qual me foi contada, por uma alegre velhinha, sentada num banco vermelho de jardim, de frente para o decrépito parque infantil onde os netos brincavam. Primeiro elucidou-me do esplendor do casamento ao qual acorreram centenas de pessoas que esperavam partilhar a extrema felicidade de um santo contrato; mas pouco depois descobriu-se, de ciência certa e sem qualquer margem para descrê, que o noivo, agora marido, mentiu descaradamente na net, de forma a conseguir casar com a nossa tenra Mémé e, desta forma, ter acesso ao seu vasto dote.
O período de deslumbramento de Mémé pelo casamento foi curto; logo após a primeira semana o casamento foi profícuo em mágoas; logo na noite de núpcias o cavalo, digo Príncipe encantado, sem que Mémé consentisse, gravou a consumação matrimonial para vender na net, assinando um contrato pelo qual se obrigava a vender novos filmes, com os mesmos protagonistas e nas mesmas condições, não obstante a repulsa de Mémé.
Logo na primeira semana, Florentino (era este o nome do desleal marido de Mémé) exigiu-lhe uma mota, topo de gama – ameaçando-a, em caso de rejeição, de disseminar pela aldeia que Mémé não era imaculada aquando do casamento. Com receio pela sua honra e bom nome, Mémé anuiu e adquiriu a mota exigida.
Abusando da sua ingenuidade, o vendedor logrou vender-lhe uma mota usada como se de uma nova se tratasse; percebendo a agitação da nossa Mémé, o vendedor conseguiu ainda vender-lhe uma semana de Time Sharing (a imprudente Mémé adquiriu este direito ao assinar uma documentação que presumia ser relativa ao seguro).
Dias depois, fingindo lágrimas que não eram suas, Florentino pediu à pesarosa esposa Euros 15.000,00 para que a sua pobre mãezinha fosse operada; esta concordou e acompanhou-o ao consultório médico sem perceber, em nenhum momento que o dinheiro que pagou seria repartido entre o esposo e a médica, sem realização de qualquer operação uma vez que a mãezinha há muito havia falecido, de ataque cardíaco, enquanto assistia ao seu Benfica a ser violentado por um árbitro sem escrúpulos.
Poucas semanas volvidas Florentino exigiu mais dinheiro à sua esposa, com o intuito de realizar um cruzeiro nos mares do pacífico, percorrendo as solarengas ilhas, na companhia do seu íntimo amigo Floriano, que segundo as mais tenebrosas línguas partilhava bem mais que a sua amizade. Perante a recusa, não hesitou em dizer que a espancava: com o persuasivo argumento Mémé condescendeu a entregar-lhe a quantia exigida, temendo pela sua integridade física.
Maravilhado pela qualidade e eficácia dos seus argumentos, dois meses depois, empunhando uma espada exigiu que Mémé lhe doasse uma casa sobre o Douro.

Caso 7

O melhor amigo do Detective Gongas é Ambrósio, apesar deste ter apenas 17 anos; Ambrósio - que não é propriamente uma pessoa inteligente, o que facilita a sua relação com Gongas - sempre demonstrou reduzida apetência para os estudos, motivo pelo qual abandonou precocemente a escola. O ano transacto, devido a um problema de saúde de seu pai, que o tornou invisual, foi obrigado a começar a trabalhar, no pequeno estabelecimento comercial da família. O seu trabalho consiste em controlar a actividade dos restantes funcionários e realizar todas as compras necessárias.
Numa saída nocturna com Gongas conheceu a bela Anabela, 15 anos, filha de um perigoso criminoso; inexperiente em temas afectivos, rapidamente ficou perdidamente apaixonado e, em menos de um mês, adquiriu um anel de diamantes e dirigiu-se ao estabelecimento prisional de Pinheiro da Cruz para pedir a mão de Anabela ao pai desta.
Na festa que realizou para comemorar o noivado com Anabela, com alguns dos seus mais íntimos amigos, bebeu demasiado e entrou num estado de euforia; a noite não terminou sem comprar a empregada de balcão e o carro do segurança, pelo dobro do seu valor.

Caso 6

Quando o detective Gongas abriu a janela do seu paupérrimo apartamento já o sol iniciava o declive que anuncia o fim do dia! A noite havia sido longa e desgastante na perseguição de um marido rico que demasiadas vezes se esquecia do caminho de sua casa, terminando a noite fora do leito conjugal.
O dia dos factos que aqui vos recordo era um dia importante para o nosso decadente detective; havia sido publicado no Diário da Republica o Decreto-Lei n.º 97/2003 de 1 de Fevereiro que permitia aos detectives privados a posse de arma de fogo. Por este facto Gongas tencionava conseguir a posse de arma, dia 3 de manhã, de molde a iniciar uma nova actividade profissional nessa mesma tarde. Esta actividade consistia na cobrança de dívidas e o plano traçado era simples: de arma em punho, dirigia-se a casa dos devedores e exigia-lhes o dinheiro em dívida, acrescido de 20%.
Para que este relato seja franco, urge sublinhar que a ideia na era de Gongas, mas de seu primo Tito, um reformado agente da polícia; ainda na semana passada havia conseguido ficar proprietário do apartamento de um velha senhora que não havia conseguido pagar ao seu médico o valor de uma operação, sob a ameaça de matar a sua nora, logo que esta regressasse de uma viagem ao estrangeiro.
Mas nem só pelo que fica escrito este era um dia especial; Gongas casou. Pelas 10 da manhã, no Registo Predial de Oeiras, Gonçalo Gaspar (Gongas para os amigos) contraiu matrimónio com Patrícia Alexandra Ferreira Borges Coutinho de Oliveira e Costa, nascida a 31 de Dezembro de 1986, 98 quilogramas de peso, 1.55 de altura e, por mera casualidade, herdeira de uma enorme fortuna.
Gongas conheceu a sua esposa numa festa em Cascais, na qual este se introduzira sem ser convidado; ao apresentar-se, afirmou ser um empresário com grandes recursos financeiros, e que, em breve, iria fazer o melhor negócio da sua vida. Apenas não lhe disse, que o negócio que ele tinha em mente, era o casamento com ela.
O pai de Paticha (como a esposa de Gongas é conhecida no seio das revistas cor-de-rosa) enriqueceu com a importação ilegal de álcool, bem como outros negócios ilícitos; a sua esposa, era uma das suas principais clientes, sendo que ao vício do álcool acumulava a incontrolável necessidade de jogar no casino, onde invariavelmente perdia.
Quando Gongas comunicou ao seu pai que tinha casado, deu-lhe a única alegria de uma vida de sofrimento e preocupações; nesse mesmo momento, dirigiu-se ao mais caro restaurante de Lisboa, pediu a mais cara refeição, bebeu o mais caro dos vinhos e digestivos; de seguida, dirigiu-se a um stand de automóveis e adquiriu o mais caro dos veículos expostos, não obstante não ter nem dinheiro, nem carta de condução.

Caso 5

As primeiras chuvas denunciavam o final do Verão. Ao longe as crianças corriam em perseguição de uma bola que teimava em fugir-lhes; no parque infantil, ordenadamente aos gritos, algumas mulheres comentavam as novelas com os olhos postos nos seus filhos, que corriam entre baloiços, cavalos de madeira, escorregas e outros instrumentos que faziam as delícias dos petizes; ali ao lado, um vendedor ambulante vendia doces e gelados às crianças, que os adquiriam com voracidade.
Escondido nuns arbustos, o Detective Gongas, fotografava um casal de namorados que, na suposição errónea de estarem devidamente protegidos, se haviam deixado corromper pelas hormonas. Carenciado de dinheiro, o nosso detective nos seus tempos livres dedicava-se a fotografar casais em situações invulgares, para posteriormente vender essas fotos para serem divulgadas na Internet.
Para aumentar os rendimentos desta actividade constituiu, por documento particular, uma Associação, com o intuito de proteger os direitos das pessoas que se dedicam a esta nobre actividade.
Mas regressemos a manha outonal em que ocorreu a história que aqui vos relato. Sentado perto de si, estava uma jovem a confidenciar a uma amiga o seu triste fado. Gongas, encantado pelo generoso decote por esta ostentado, sentiu-se atraído a escutar a conversa. A jovem, Célia de seu nome, contava como havia sido persuadida a adquirir um quadro caríssimo; pouco conhecedora de arte, entrou numa galeria e confundiu um quadro de um qualquer pintor desconhecido, por um autêntico Picasso; dirigindo-se ao vendedor, este não a elucidou do engano, conseguindo por este meio uma magnífica comissão, ao vender o quadro por um valor muitíssimo superior.
Mas a triste sorte de Célia não ficou por aqui; numa deslocação ao massagista, conheceu o homem com que sempre sonhara: alto, moreno, olhos verdes, musculado, dentes brancos de onde irradiava um sorriso cativante; a meio da sessão de massagem, já o seu coração tinha dono. Não obstante a sua timidez, a tarde não terminou sem convidar o massagista Pedro para um jantar, no mais romântico restaurante da cidade.
Mas o que parecia uma noite encantada, veio a revelar-se fatídica; ao ingerir o segundo copo de vinho tinto alentejano, Pedro começou a ter comportamentos estranhos, pouco consentâneos com o local onde se encontrava. Pela sua má conduta – praguejar com os empregados, discutir com os clientes das outras mesas, insultando algumas pessoas – foi, com alguma violência, “convidado” a abandonar o restaurante. Já no seu exterior, passou um cheque de 500 € e adquiriu o automóvel do empregado de mesa.
Não obstante a oposição de Célia, Pedro dirigiu-se para um bar da cidade, onde continuou a beber, ficando a cada hora que passa num estado de maior exaltação; com uns amigos que encontrou no bar, decidiram ir terminar a noite a uma discoteca Algarvia; com receio, Célia, optou por disfarçadamente abandonar o bar, preferindo um táxi a entrar no carro de Pedro.
Por se ter deixado dormir, só no dia seguinte a nossa heroína teve conhecimento do acidente de viação sofrido por Pedro; desse acidente, resultou não apenas uma perna partida, como lesões cerebrais permanentes.
Em consequência da patologia de Pedro, é a sua mãe que trata de todas os seus problemas, não apenas as necessidades físicas, mas também todos os negócios jurídicos relativos ao seu património. O facto de passar junto do filho quase a totalidade do seu tempo, colocou em risco a sua relação sentimental com Juvenal, marido ciumento e possessivo que, para conquistar a afeição de Maria (mãe de Pedro) havia assassinado o seu marido.
Para compensar Juvenal pela sua ausência, Maria, retirou algum dinheiro da conta de Pedro e ofereceu-lhe um BMW descapotável. Mas, nem com esta generosa oferta, Maria conseguiu recuperar a estima do seu amado marido; encorajada pela vizinha Madalena, recorreu aos serviços do detective Gongas para averiguar se é a única mulher a viajar no BMW de Juvenal…

Caso 4

O detective privado Gongas estava inclinado sobre a sua poltrona azul-marinho, tendo os seus sapatos de camurça estragados, sobre a velha secretária de pinho. Em cima da mesa, três velhas esferográficas oferecidas por outras tantas oficinas de reparação automóvel, mordidas na ponta; ao lado, um velho cinzeiro, repleto de pontas de cigarros mal apagados, transbordando de cinza; e um computador, que mais não servia do que para pesquisar na net sites de gosto duvidoso.
Lá fora ouviu vozes; recompôs-se na cadeira, agarrou um velho Diário da Republica que abriu sobre a mesa, onde apressadamente sublinhou uma lei elaborada pelo governo sobre a organização da defesa nacional, e, agarrou o telefone, iniciando uma conversa fictícia, na ânsia de não demonstrar a completa ausência de clientes. Ao ouvir baterem na sua velha porta, balbuciou um “pode entrar” fingindo-se absorto pela conversa imaginária; com um gesto largo com o seu braço esquerdo, indicou à sua visitante uma cadeira suja e gasta.
A jovem sentou-se; lábios grossos, cabelo pelos ombros, castanhos-escuros, olhos da mesma cor, que irradiavam um brilho que a tristeza não conseguia esconder. Vinha vestida com uma blusa de malha, não excessivamente decotada e uma saia travada, pelo joelho. Discretamente os seus olhos formosos, percorreram o espaço frio onde o nosso detective atendia os seus poucos clientes. Uma mesa gasta, três estantes desarrumadas, duas delas apenas com algumas revistas, um vaso com uma planta artificial e um cabide; ao fundo uma sofá, vermelho, manchado, decrépito.
Terminada a conversa fantasma Gongas pediu desculpa por a sua funcionária estar ausente, mas tinha saído numa missão (a desculpa oficial, desde que aquela se havia despedido, há três anos, cansada de esperar por longos meses de ordenados em atraso); perguntou-lhe o nome e a que a trazia ao escritório de um dos melhores detectives de Lisboa.
Matilde – era este o seu nome – por entre lágrimas sofridas contou a sua história; aos dezasseis anos engravidou de Ambrósio, tendo sido obrigada a casar por Carlitos, o homem que a criou como um pai, um velho agricultor do interior alentejano que não aceitava sustentar uma filha, menor, mãe solteira.
Os dois primeiros anos de casamento, com excepção das agressões psicológicas do marido nas noites em que bebia demasiado, foram quase como um conto de fadas, que a sua mãe lhe lia todas as noites, pouco antes do acidente de viação que tornou Matilde órfã de pai e mãe.
O seu triste fado começou quando Eduardo trocou a monotonia da vida conjugal pelas noites na boémia nos bares e discotecas de Lisboa. Em poucos meses a conta bancária do casal sofreu perdas irreparáveis, fruto dos gastos de Ambrósio em noites, copos, jogo e outros vícios que Matilde não sabia, mas desconfiava…
Em concreto o que preocupava Matilde nesta manha invernal era o receio do marido alienar um monte alentejano, para custear uma planeada viagem ao Brasil, com o intuito de conhecer o Carnaval do Rio.
Consternado, o Detective Gongas inquiriu-a sobre o motivo porque não Matilde não abandonava o lar conjugal; era jovem, bela, alguns estudos, pelo que não teria extremas dificuldades em encontrar um emprego, para depois refazer a sua vida. Com as lágrimas a percorrem a sua cara morena, explicou que ainda amava o marido; e mesmo que já não o amasse, não tinha para onde ir, uma vez que descobrira recentemente que a casa que recebera de herança pelos seus pais, havia sido doada por Carlitos a Júlia, uma das suas mais íntimas amigas.
Este belo duplex situado em Cascais, com uma deslumbrante vista para a marina cantada pelos Delfins, tem sido, nos últimos meses, fruto de várias mudanças de dono; com efeito, Deolindo persuadiu Júlia, com a ajuda de um revolver, a vender-lhe esta casa, por um preço muito inferior ao de mercado; mas este acto não fez a felicidade de Deolindo, uma vez que, Gustavo a adquiriu por este mesmo valor, após atemoriza-lo com a advertência de que a recusa em vender teria como resultado a morte da D. Deolinda, a mãe amada de Deolindo.
Atónito com todas estas revelações, o Detective Gongas, ainda incrédulo, não sabe o que fazer para responder aos problemas de Matilde; não querendo demonstrar a sua ignorância, envia-lhe um e-mail, pedindo lhe ajuda. O que lhe responderia?

Caso 3

Ana Isabel nascida em 26 de Janeiro de 1984, desde a mais tenra idade indiciou tratar-se de uma pessoa muito activa. Excelente aluna, filha exemplar e menina muito prendada, desde os seus cinco anos que tinha aulas de Francês e tocava piano.
Entre as suas muitas inquietações, sublinhe-se a protecção dos animais; este facto, levou-a a liderar um grupo que constitui uma Associação para defesa daqueles, contando para tal com o auxílio do seu tio Fernando, Advogado, e que, no seu escritório celebrou o contrato constitutivo da Associação.
No âmbito da Associação, por Ana Isabel presidida, organizaram um concerto de musica clássica de molde a angariar dinheiro, tendo utilizado a quantia arrecadada, equitativamente, na criação de um lar para gatos e numa cresce para as crianças necessitadas da freguesia.
Para a sede da sociedade, alugaram uma casa, pertencente a Bernardo, que este ardilosamente convencera Ana Isabel, tratar-se de um antigo palácio nobiliárquico, justificando assim a exorbitante renda.
Para recuperar o “pseudo-palácio” , nomeadamente no que concerne à fachada, Ana Isabel pretendeu copilar a legislação existente sobre recuperação de imóveis, tendo encontrado o Decreto-Lei n.º 210/98, de 15 Janeiro, que proibia a alteração de fachadas, a Portaria n.º 700/99, de 22 de Fevereiro, que o permitia, e a Lei n.º 20/2002, de 24 de Janeiro, que obrigava os interessados na alteração de fachadas a pedir autorização ao Instituto Português de Arte.
Como recompensa por a sua actividade em benefício da comunidade, uma conhecida marca de automóveis, presenteou Ana Isabel com um “topo de gama”; ao ter conhecimento desse facto, o seu ex-namorado Hugo, interpelou-a, obrigando-a a oferecer-lhe o carro, sendo que, se o não fizesse, este divulgaria num jornal regional, fotos comprometedores, tiradas numa despedida de solteira, em casa de Ana Isabel, sem que esta tivesse conhecimento das mesmas. Atemorizada com essa possibilidade, esta ofereceu-lhe o carro de imediato, facto do qual agora se arrepende.

Caso 2

Andreia no dia em que completou 17 anos contraiu foi viver com o seu apaixonado Manuel, um ano mais velho, apesar da expressa oposição dos seus pais, que desde o início do namoro se opunham à relação. Para tanto escolheram para casa de morada de família um modesto imóvel pertencente a Carlos, uma vez que o dinheiro que Andreia recebia como funcionária de um Hipermercado não permitiu arrendar o imóvel com que sonharam.

Com objectivo de conseguir aumentar os rendimentos da família, Manuel adquiriu um camião e dedica-se ao transporte de mercadorias. A vida floria ao jovem e apaixonado casal até que, numa manha de chuva e nevoeiro, Manuel, que desrespeitava o limite de velocidade estatuído na lei, não consegui realizar uma curva e se despistou numa pequena ravina. Em consequência do acidente de viação, Manuel perdeu parte das capacidades motoras, visão e audição. Andreia ao receber a notícia ficou transtornada; o acidente ocorreu no mesmo dia em que ela recebera a confirmação de que estava grávida de gémeos.
A profunda dor de Andreia conduziu-a ao álcool. Todas as noites era a primeira a chegar e a ultima a sair do bar da esquina; enquanto bebia, alienava a baixo custo o seu património, aos outros clientes do bar, que desta forma se aproveitavam do alcoolismo de Andreia.

Mila, vizinha de cima e melhor amiga de Andreia, testemunha do estado de abandono a que esta vetara Manuel, pediu em Tribunal a inabilitação deste. Porém e enquanto o processo corria, Manuel deslocou-se ao notário e em testamento deixou todo o seu património disponível aos filhos que Andreia esperava.

Caso 1

Carlos Ferreira, nascido em 20 de Dezembro de 1983, que, e apesar da tenra idade, passara já por várias experiências que lhe conferiam uma maturidade que surpreendia. No ano passado os pais sofreram um acidente de viação no qual pereceram, o que o obrigou a assumir o controle das empresas da família, sob o amparo de Doroteia, irmã mais velha do seu pai.
Maria Cruz nascida no conturbado ano de 1975 há muito que procurava um bom casamento. Conheceu Carlos na festa de aniversário da sua amiga Helena e logo se interessou por ele. Usando a sua vasta experiência em sedução, Maria depressa atraiu as atenções de Carlos que pensou ter encontrado a mulher da sua vida, tendo, nessa mesma noite oferecido-lhe um anel de esmeraldas, adquirido com o seu primeiro salário. Contrariando as expectativas de Doroteia casaram-se num lindo dia de Março, sem que a velha tia tenha tomado conhecimento.
Mas como nem só de casamento vive o amor, Maria mantinha secretamente uma ligação com Pedro o que, numa cidade pequena como Beja, rapidamente o que era secreto deixou de ser. E o desfecho foi a ruptura da vida conjugal.
Mas o destino é feito de imprevistos. Maria, perante a pressão social a que se viu sujeita ou por legítimo arrependimento, não suportou a situação e, na antevéspera da audiência, ingeriu um frasco de barbitúricos e faleceu no dia em que o seu casamento completaria 3 meses, tendo deixado a Carlos, através de testamento, a moradia de que era proprietária.
Carlos ficou arrasado. Não se conformava com a ideia de que a "mulher da sua vida" se poderia ter comportado daquela forma e ainda mais como tudo tão subitamente terminara. Encetou então uma nova fase na sua vida, na qual o álcool, a noite e o jogo passaram a ter papel preponderante. E com isto a sua pequena fortuna sofreu um sério abalo, nomeadamente após adquirir um automóvel de luxo depois uma noite em que ingerira duas garrafas de Vodka.
Nesta nova fase sentindo-se sempre muito só e infeliz busca o conforto feminino. É então que conhece num bar a jovem e terna Susana e, pensando que desta vez seria diferente, casou com ela em Setembro último.

Apresentação...

Este é um blogue para estudantes de Direito. Aqui vão encontrar diversos casos práticos. A opção por deixa-los num blogue, relaciona-se com o facto de permitir que sejam resolvidos on line, permitindo aos discentes a troca de dúvidas. O estilo dos casos.. é pouco convencional, um pouco diferente do ordinariamente habitual nas cátedras de Direito; mas é o nosso, do qual não queremos, nem conseguimos abdicar.A criação deste espaço tem como única explicação a nossa paixão pelo ensino, este vício de gostar do que fazemos e a tentativa de encontrar novos meios para o fazer melhor.Finalmente, deixamos dois reptos; um para os discentes: resolvam on line os casos, permitindo a outros apreenderem convosco; outro repto, para colegas: imitem-nos, deixem na Internet os casos práticos fechados nas reprografias...