Monday, November 30, 2009

Caso 78



Fabiana era uma jovem adulta similar a milhares de outras, sem um aspecto peculiar que caracterizasse, uma espécie de fotocópia de uma geração onde quase todos são iguais ou muito parecidos: não era alta nem baixa, nem gorda nem magra, não tinha corpo perfeito ou imperfeito, não era bem feia nem bonita; se me permitem a metáfora, uma espécie de arroz doce, que não sendo a sobremesa predilecta de ninguém, ninguém se recusa a comer!
Mas sempre foi uma petiza feliz, que viveu na plenitude a sua infância, aproveitando o excelente clima e as belezas naturais, o calor e a praia, as deliciosas e inexploradas comidas, típicas de um local tão típico e amoroso como a Ilha da Madeira.
Mas Fabiana desabrochou quando o amor a encontrar, numa noite de Novembro, quando a chuva gela os corpos e aquece os corações: ele era meloso, simpático, extrovertido, um pouco feia, mas de uma fealdade rija que lhe beleza! Porque era uma mulher séria, Fabiana, só lhe ofereceu a sua virgindade, já depois de casada, na igreja da sua infância. E só não foram felizes para sempre, porque isto é um teste de Direito da Família e se não houver drama os meus prezados alunos não têm com que se entreter… Por falar em drama, seis meses após o casamento, Fabiana e o seu Fabiano, um açoriano, descobriram que eram irmãos, ele concebido em pecado numa noite de Verão!
Afastaram-se depois da dolorosa descoberta! Marisela, mãe de Fabiana e que vivia maritalmente como o padrasto, ainda procurou persuadir a filha de fugir do amor que sentia: mas Fabiana era mula como uma teimosa e nunca mais quis ver o marido irmão!
Veio para o continente estudar para Beja. Onde reencontrou a paz e o amor, nos braços quentes de um alentejano! Numa viagem à Jamaica casaram na praia, tiveram quatro filhos, todos homens, todos feios, todos simpáticos!
Mas o alentejano, Tiago Bruno de seu nome, escondia um segredo: tinha uma segunda família, uma mulher com quem vivia e tinha quatro filhas, todas mulheres, todas feias, todas simpáticas! O drama apenas se descobriu, quando o orçamento de Tiago Bruno explodiu, depois de vender tudo o que os pais lhe deixaram! Por pagar, estão os móveis da casa com Fabiana, um carro que ele comprou mais só ela usava, bem como as despesas do médico das suas quatro filhas!
Desesperada, Fabiana ainda casada vai trabalhar para um bar de strip tease! Até que conhece um Padre e volta a apaixonar-se! Perdidamente. Terrivelmente. Profundamente. A mais bela paixão de todas as paixões. E já passaram anos e Fabiana continua a amar intensamente, a mais feliz freira de todas as freiras, afastada dos homens e casado com Deus.

Wednesday, November 18, 2009

Caso 77



Reinaldo e Deolinda, ambos de 17 anos, conheceram-se numa festa na Pandora. É um eufemismo falar em amor À primeira vista, porquanto o que os uniu foi um desejo momentâneo, uma paixão mais alcoólica do que real. Saíram juntos da discoteca, foram juntos na mota que ele tinha comprado com o seu primeiro vencimento e passaram a noite num Hotel, que ela pagou, com o dinheiro que a mão lhe tinha dado de prenda de anos, entregaram-se ao amor carnal e cada um seguiu o seu caminho, sem jamais pensar que a vida os voltaria a encontrar.
Mas o destino é um fado cruel e um mês depois Deolinda constatou que estava grávida, que carrega consigo a culpa da travessura de uma noite! Avisou-o por sms, quer da criança, quer na necessidade de se casaram, porque o pai dela era um homem tradicional e violenta, que preferia a prisão a ser avô de filha solteira! A esperança dos nossos heróis era um Regulamento Comunitário que proibia o casamento antes dos 20 anos para todas as pessoas caucasianas!
No dia em que o malvado teste transformou em certezas as dúvidas de Deolinda, ambos se isolaram do mundo, agarrados ao pavor da descoberta, arrasados e infelizes! E sentiram-se as pessoas mais solitárias do mundo! Deolinda acabou por encontrar consolo num cão, Óscar de seu nome (que ela não sabe classificar juridicamente!); por seu turno, Reinaldo acabou a noite a desabafar com Eduardinho, invisual, seu amigo desde infância e herdeiro de uma fortuna fabulosa!
Bem como de Fabiano, que se aproximou deles no fim da noite, apavorado! Pressionado por uma caçadeira apontada à sua cabeça, havia doado o seu automóvel a Ulisses, na presença de quatro testemunhas! E quando quis avisar a PSP, descobriu que o iphone que comprou a um gajo qualquer cujo nome não me apetece dizer, era falsificado!

Quid Juris

Caso 76



Reinaldo estava a passear de barco pelo Alqueva, numa noite gélida de Inverno, tendo as estrelas por companhia, carregando nos ombros o peso de dislates e asneiras: naquela noite de Novembro, sentia-se o mais solitário dos homens!
Numa noite de copos, tinha cedido às tentações da carne e perdido nos braços de uma linda desconhecida baptizada de Deolinda, que semanas depois lhe fez chegar por sms a trágica notícia de uma gravidez indesejada. Bem como o desejo de casar, para satisfazer um pai tirano, que ainda por cima tinha talento com armas. A ténue esperança de Reinaldo era o Decreto-Lei 120/09 de 17 de Novembro determinava que a capacidade jurídica para casar passaria para os 20 anos, porquanto eles tinham ambos 17 anos! No cais, esperava-o a mota que havia comprado nesse mesmo dia, antes da desgraça ter sido revelada!
Reinaldo ficou tonto a olhar para o telefone. Que por acaso era um excelente iphone, comprado a Hermenegildo por 60 €, embora Reinaldo agora quisesse devolver o telemóvel, por ter descoberto que o mesmo era falsificado. E culpava-se de naquela noite na Discoteca, ter dito à Deolinda, que apenas tinha conhecido nessa noite, que a amava e queria ficar com ela para o resto da sua vida!
Reinaldo sentia falta do seu pai, seu melhor amigo desde sempre: mas desde a morte da mãe, que o pai se entregara ao álcool, perdeu o seu emprego, arrastando-se entre a casa e a taberna, sem interesse pela vida e pelos seus negócios, que definhavam com o desinteresse do seu dono! Aliás, numa noite em que estava profundamente embriagado, o malvado Ulisses, obrigou-o a declarar perante 4 testemunhas e filmado com um telemóvel, que lhe doava com efeitos imediatos uma casa senhorial na aldeia, tendo Ulisses ficado imediatamente com a chave!

Quid Juris

Caso 75



Deolinda estava sentada num pequeno banco de madeira, aproveitando uma deslumbrante visão do grande lago do Sul, perdida nos seus pensamentos, recordando, com lágrimas, as ultimas semanas da sua vida, após um fantástico repasto num maravilhoso restaurante de Monsaraz! Sentia-se culpada. Dos seus erros e dos erros dos outros!
Nessa tarde tinha assistido ao casamento da sua melhor amiga: Maria, sumptuosamente bela, com tez morena, longos e cuidados cabelos negros, cheios de vida e pudor, um corpo de criança que começava a desabrochar aos 15 anos, havia contraído matrimónio com Juvenal, catorze anos mais velho, num casamento cigano que demorou três dias e outras tantas noites!
Deolinda era dois anos mais velha que a amiga e já trabalhava, como estilista de uma conceituada marca, após ganhar o primeiro prémio num concurso de Moda, organizado por uma empresa cujo nome não posso dizer, para não ferir a susceptibilidade inocente das criancinhas que têm de fazer este teste. Com o primeiro ordenado, Deolinda comprou um pc Apple que era caríssimo, mas lindo de morrer; bem como um iphone por 600€, usando o dinheiro que a sua mão lhe deu de prenda de anos!
Mas as lágrimas de Deolinda não eram apenas em honra da sua amiga: chorava de pânico e medo, de dúvidas e remorsos, sem saber o destino a dar ao filho que carregava no seu ventre, concebido sem amor numa noite de copos. Com temor ao pai, ainda ponderou casar com Reinaldo, o futuro pai. Mas o Decreto-lei 120/09 de 17 de Novembro determinava que a capacidade jurídica para casar passaria para os 20 anos!
E o choro compulsivo fazia-a recordar a sua avó, uma forte e abnegada senhora que desde pequena foi toda a sua família, cumprindo com excelência a ausência dos seus pais que emigraram para um País distante para fugir da miséria, deixando Deolinda nos braços ternos da sua avozinha, que foi mãe e pai, mana e melhor amiga: até ao fatídico dia em que numa operação perdeu a visão, para se deixar cegar na tristeza de não sair de casa, deixando de cuidar das casas e terras que foram desde sempre a sua vida!
Deolinda com lágrimas de choro olhava o lago distante e tão perto, a ponte que lhe fazia perpassar na mente pensamentos fatalistas, com a certeza errada que era a mais infeliz petiza do mundo! Até que chegou Óscar! Que lhe roubou um sorriso, que a fez despertar de letargia, fazendo-lhe festas, sentando-o no seu colo e afagando-o contra o peito, em instantes de carinho, que lhe devolveram um pequeno sorriso ao rosto triste! Porque não há amizade mais puro que o carinho dos cachorros com os seus donos!
Quid Juris