Tuesday, May 16, 2006

Caso 10

Esmeralda é a pérola das quatro petizes do casal Cristiano e Cristiana Martins e Martins. Desde a mais tenra idade que demonstrou peculiar inteligência e apetência para auxiliar todos os que a rodeiam, sem menosprezar o sexo, a idade ou a condição, numa incessante luta em benemérito daqueles que necessitavam do seu amparo. Mémé (como era conhecida na sua aldeia) tinha como lema de vida ajudar quem lhe estava próximo, especialmente se desconhecidos; quando procuravam retribuir, dizia sempre: “ajuda alguém que realmente precise! Faz um favor enorme a alguém”. Pensava, desta forma simples e carinhosa, formar uma enorme corrente de solidariedade desinteressada.
Mémé não era bela. Ou, pelo menos, não tinha a anoréctica beleza estereotipada das revistas de adolescentes, sarcasticamente consagrada para generalizar a tristeza. Mémé era, portanto, ligeiramente anafada, mas imensamente feliz.
Mas cingimo-nos à nossa história… Era uma vez uma rechonchuda e pura aldeã, benfeitora nas horas vagas que recebeu um PC portátil como prémio de um concurso de pintura. Aventurou-se nos chats e conheceu um príncipe encantado que prometia vir resgatá-la num lindo cavalo branco, mas, com o correr do tempo se mostrou digno de receber a nomenclatura de um qualquer equídeo de baixa categoria.
Mas regressemos à nossa Méme e deixo-vos aqui a história, tal qual me foi contada, por uma alegre velhinha, sentada num banco vermelho de jardim, de frente para o decrépito parque infantil onde os netos brincavam. Primeiro elucidou-me do esplendor do casamento ao qual acorreram centenas de pessoas que esperavam partilhar a extrema felicidade de um santo contrato; mas pouco depois descobriu-se, de ciência certa e sem qualquer margem para descrê, que o noivo, agora marido, mentiu descaradamente na net, de forma a conseguir casar com a nossa tenra Mémé e, desta forma, ter acesso ao seu vasto dote.
O período de deslumbramento de Mémé pelo casamento foi curto; logo após a primeira semana o casamento foi profícuo em mágoas; logo na noite de núpcias o cavalo, digo Príncipe encantado, sem que Mémé consentisse, gravou a consumação matrimonial para vender na net, assinando um contrato pelo qual se obrigava a vender novos filmes, com os mesmos protagonistas e nas mesmas condições, não obstante a repulsa de Mémé.
Logo na primeira semana, Florentino (era este o nome do desleal marido de Mémé) exigiu-lhe uma mota, topo de gama – ameaçando-a, em caso de rejeição, de disseminar pela aldeia que Mémé não era imaculada aquando do casamento. Com receio pela sua honra e bom nome, Mémé anuiu e adquiriu a mota exigida.
Abusando da sua ingenuidade, o vendedor logrou vender-lhe uma mota usada como se de uma nova se tratasse; percebendo a agitação da nossa Mémé, o vendedor conseguiu ainda vender-lhe uma semana de Time Sharing (a imprudente Mémé adquiriu este direito ao assinar uma documentação que presumia ser relativa ao seguro).
Dias depois, fingindo lágrimas que não eram suas, Florentino pediu à pesarosa esposa Euros 15.000,00 para que a sua pobre mãezinha fosse operada; esta concordou e acompanhou-o ao consultório médico sem perceber, em nenhum momento que o dinheiro que pagou seria repartido entre o esposo e a médica, sem realização de qualquer operação uma vez que a mãezinha há muito havia falecido, de ataque cardíaco, enquanto assistia ao seu Benfica a ser violentado por um árbitro sem escrúpulos.
Poucas semanas volvidas Florentino exigiu mais dinheiro à sua esposa, com o intuito de realizar um cruzeiro nos mares do pacífico, percorrendo as solarengas ilhas, na companhia do seu íntimo amigo Floriano, que segundo as mais tenebrosas línguas partilhava bem mais que a sua amizade. Perante a recusa, não hesitou em dizer que a espancava: com o persuasivo argumento Mémé condescendeu a entregar-lhe a quantia exigida, temendo pela sua integridade física.
Maravilhado pela qualidade e eficácia dos seus argumentos, dois meses depois, empunhando uma espada exigiu que Mémé lhe doasse uma casa sobre o Douro.

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